CRÔNICA
A BANDA - FRANCISCO RAFAEL PEREIRA
É interessante observar como a gente se
organiza em sociedade. Na Europa quase todas as cidades têm uma Banda, uma
orquestra sinfônica ou uma filarmônica. Aliás quase todas as familias têm um ou
mais membros que tocam algum instrumento. É uma questão de cultura, de gosto e
de poder econômico.
Por volta
de 1920 minha cidade natal, Bebedouro, hoje Aiuaba, foi tocada por este
surto cultural trazido da Europa pelos padres ou por filhos de famílias
abastadas que iam estudar na Europa.
Não sei bem porque motivos foram tocados para
tal proeza, os rapazes resolveram formar uma Banda de Música. Uns já eram casados, outros solteiros e alguns
meninos em idade escolar. O certo foi que resolveram formar a Banda local. Meu
pai optou pelo piston, meu tio pelo
Bombardino, outro parente pela tuba,. Tio Zé Dias da Pedra Branca, um sitio afastado,
os instrumentos de percussão. Francisquinho
Andrade, um moço rico, a Clarineta. Minha mãe que já era cantora do
coral da Igreja, tocava a Rabeca. Todos tiveram de custear as aquisições de
cada instrumento. A Banda estava
formada.
Uma coisa entretanto havia sido esquecida:
Quem iria regê-la? Quem iria afinal
afinal ensinar os primeiros acordes, as noções de solfejo, o andamento da música? Ninguém sabia qualquer coisa sobre a teoria
musical, harmonia, execução, e profilaxia dos instrumentos. Andaram soprando e fazendo barulho na porta do
comércio mas tocar não conseguiram.
Meu avô vendo aquela situação de boa vontade e frustrações, indicou a
solução do impasse: precisavam contratar um professor de Música, um organizador
ou Maestro. Tomou iniciativa e encontrou um em Lavras da Mangabeira. Nossa cidade deveria está em ótima situação
econômica para poder importar um Maestro...
Ele chegou a nossa vila, carregando partituras e um copioso acervo didático: Bravos!
Esteve ali ensinando teoria musical,
instrumentação, solfejo, execução e
harmonia por cerca de um ano. Os parcos
informantes disseram-me que o Maestro se
cansou. O aproveitamento deveria ter sido mínimo. Na verdade a vcação artística
era quase nenhuma. O Maestro demitiu-se
e foi embora . Deve ter sido uma tarefa
próxima do impossivel, aquela de transformar os cabeças de bagres em
verdadeiros músicos.
Tio Zé Pedro, um dos ex - quase futuros músicos, disse - me que
certo dia aós a partida do Maestro, a Banda resolveu sair a rua, tocando para o público. Tentaram tocar
um dobrado, uma das raras peças que o Maestro havia ensinado. Naturalmente os rapazes queriam justificar os altos invetimentos de seus pais. A população porém
nada entendeu era apenas uma barulheira enorme. Desistiram, recolheram os
instrumentos que mais tarde foram vendidos para Saboeiro, onde mais tarde uma
Banda foi formada.
No
Congresso Eucarístico de 1955 Padre Odorico Andrade ainda se referia a
aquele tremendo esforço dos rapazes de Bebedouro onde ele havia sido vigário e
arrematava: eles eram tão empolgados mas nada podiam fazer...
Francisquinho
Andrade moço rico das redondezas, foi mais perseverante. Muitos anos
mais tarde saiu ládeseu sitio de Clarineta em punho, tocando uma peça, algum
cântico Gregoriano que havia aprendido no Seminário. A garotada correu em sua direção para ver o queestava acontecendo. Ele parecia
um fauno, um adorador do Deus Pan, numa tarde morna de verão.
Enquanto estas coisas aconteciam com a
rapaziada da Banda, eu ainda não havia nascido, porém mais tarde um dia
estávamos indo para o sítio Minador e seguímos a estrada da Bela Vista. Num
determinado ponto a estrada bifurca-se em y; tomamos a perna da direita. Ao nos
afastar deste ponto uns em metros, ouvimos uma música melodiosa e rara que
alguém vinha executando pela perna
esquerda da estrada, em direção contrária. Era Francisquinho Andrade e sua
Clarineta. Era o último remanescente
daquela tentativa de Banda que nunca chegou a ser. E aquele era o último acorde daquele surto
cultural.
... Porém chegou o momento aprazado. Aiuaba
tem a mais de dez anos sua nova Banda, com músicos jovens e seu Maestro, graças
a teimosia e pertinácia da professora Maria Adalzira de Oliveira. Em março de
2008 a Câmara de Vereadores local lotada pela
primeira vez, em Ato Solene oficializou o Hino de Aiuaba, da autoria de
Adalzira com a presença do Prefeito, Secretários, o hit da sociedade, inclusive
o homem mais idoso do lugar: Raimundo Guerreiro, seu pai... A Banda tocou o
Hino da autoria de Adalzira quando ela recebia o original do Decreto- Lei Municipal reconhecendo o Hino Municipal e a nova Banda. Aleluia... Salve, Salve.
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