Romance II ou do ouro incansável
Mil bateias vão rodando sobre córregos escuros; a terra vai sendo aberta por intermináveis sulcos; infinitas galerias penetram morros profundos.
De seu calmo esconderijo, o ouro vem, dócil e ingênuo; torna-se pó, folha, barra, prestígio, poder, engenho . . . É tão claro! — e turva tudo: honra, amor e pensamento.
Borda flores nos vestidos, sobe a opulentos altares, traça palácios e pontes, eleva os homens audazes, e acende paixões que alastram sinistras rivalidades.
Pelos córregos, definham negros a rodar bateias. Morre-se de febre e fome sobre a riqueza da terra: uns querem metais luzentes, outros, as redradas pedras.
Ladrões e contrabandistas estão cercando os caminhos; cada família disputa privilégios mais antigos; os impostos vão crescendo e as cadeias vão subindo.
Por ódio, cobiça, inveja, vai sendo o inferno traçado. Os reis querem seus tributos, — mas não se encontram vassalos. Mil bateias vão rodando, mil bateias sem cansaço.
Mil galerias desabam; mil homens ficam sepultos; mil intrigas, mil enredos prendem culpados e justos; já ninguém dorme tranqüilo, que a noite é um mundo de sustos.
Descem fantasmas dos morros, vêm almas dos cemitérios: todos pedem ouro e prata, e estendem punhos severos, mas vão sendo fabricadas muitas algemas de ferro.
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário